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Os transtornos comportamentais podem estar relacionados com a disbiose intestinal?

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Vera Ângelo Andrade

Tempo de Leitura: 3 minutos

O interesse pelo estudo da relação entre distúrbios comportamentais e microbioma têm crescido nos últimos tempos. Será que se manipularmos a microbiota poderemos resolver problemas tais como depressão e ansiedade?   Microbioma e microbiota são termos diferentes, mas muitas vezes usados como sinônimos. Interessante definir estes termos.

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Microbioma e microbiota: como diferenciar?

Microbioma é o conjunto de bactérias, vírus, arqueias, fungos e protozoários que compõem o organismo, ou seja, é o patrimônio genético.  A determinação de uma “assinatura” ou perfil de microbioma inicia-se logo no nascimento.

Microbiota por outro lado é a população de microrganismos que coloniza um determinado local e pode ser alterada por fatores externos como tipo de parto, aleitamento ou uso de fórmula, uso de antibióticos, dieta, estresse dentre outros.  A importância da microbiota nas mucosas da cavidade oral, do trato respiratório, vaginal e do intestino tem sido estudada, mas a intestinal é a que tem mais se destacado. Quando há um desequilíbrio desta microbiota teremos a disbiose.

Como diferenciar eubiose de disbiose?

Eubiose é definida como o equilíbrio da microbiota intestinal e exerce várias atividades relacionadas a nutrição e metabolismo, função de barreia e relação (crosstalk) com sistema imune.

microbiota intestinal

Disbiose é o desequilíbrio na diversidade e na homeostase do microbioma. Segundo a literatura, já foi relacionada a alterações de imunidade, neoplasias, doenças intestinais inflamatórias, síndrome do intestino irritável desordens do sistema nervoso, tais como transtornos do espectro autista, depressão e ansiedade.

Qual a relação entre a microbiota intestinal e o eixo intestino-cérebro?

Já é sabido que o eixo intestino-cérebro é constituído por rotas bidirecionais de informação e diretamente relacionado com a eubiose ou disbiose intestinal. Para comunicação se utiliza o sistema nervoso parassimpático e os sistemas imune, neuroendócrino e circulatório (permite a passagem de metabólitos e neurotransmissores produzidos pelo intestino). Mas como sinais presentes no intestino são capazes de alcançar o cérebro? Outro fato a destacar é a transdução de sinais a partir de células do sistema nervoso entérico, que é constituído por complexa rede de neurônios e células da glia. A figura a seguir ilustra esta relação eixo cérebro-intestino, destacando ainda o papel dos neurotransmissores, dos imunomediadores e dos ácidos graxos de cadeia curta.

tronco cerebral

Fonte: Andrade, VLA et al. Microbiota na SII In Faintuch J. Microbioma, disbiose, probióticos e bacterioterapia. 2017

Transtornos comportamentais X microbioma intestinal

Estudos mostraram que a microbiota intestinal pode alterar as funções cerebrais e até mesmo o comportamento em animais germes free, animais tratados com probióticos, prebióticos ou antibióticos e transplante fecal. Nos transtornos do espectro autista o envolvimento do microbioma intestinal se dá na fase de desenvolvimento após o nascimento. Na depressão há uma redução da diversidade de microrganismos colonizando o intestino quando comparados aos indivíduos saudáveis. A relação entre disbiose e doenças do sistema nervoso também é muito estudada.

Estudo publicado em dezembro de 2021 pesquisou na base de dados Pubmed com os descritores “microbiota”, “disbiose”, “transtornos comportamentais e selecionou onze artigos de 2015 a 2020, com o objetivo de avaliar se o microbioma intestinal desencadearia transtornos psiquiátricos. Concluiu que a comunicação entre o sistema nervoso central e o trato gastrointestinal ocorre por alterações da permeabilidade intestinal, que possibilita a passagem de metabólitos (ácidos graxos, ácidos biliares e metabólitos derivados do triptofano) para o sangue além da barreira hematoencefálica. Esses metabólitos agem nas amígdalas cerebrais e interferem no comportamento e na ansiedade e na mielinização do córtex pré-frontal (depressão, esquizofrenia e transtornos do espectro autista).

Será que se manipularmos a microbiota poderemos resolver os transtornos comportamentais?

Ainda não está totalmente elucidado como a manipulação da disbiose poderia interferir em distúrbios tais como autismo, depressão e ansiedade. Parto normal, amamentação e evitar uso precoce e recorrente de antibióticos seriam fatores protetores. 

Inibidores seletivos da recaptação de serotonina podem atuar contra gram positivos (Staphylococcus spp. e Enterococcus spp.) e enterobactérias e tricíclicos atuariam contra E. coli, Yersinia e Giardia sp. Teoricamente os psicofármacos podem restabelecer a eubiose, porém estudos mais consistentes são necessários para definir cepa e dose.

Referências bibliográficas:

  • Souzedo FB, Bizzarro L, Pereira APA. O eixo intestino-cérebro e sintomas depressivos: uma revisão sistemática dos ensaios clínicos randomizados com probióticos J. Bras. psiquiatr. 2020, 69 (4). https://www.scielo.br/j/jbpsiq/a/vC7DMqRZtLcK7QmxS6NH3jM/?lang=pt

  • CRYAN, JF et al. The Microbiota-Gut-Brain Axi. American Physiological Society, 2019. 99, (4),1877-2013. doi: 10.1152/physrev.00018.2018

  • Poloni TCP et al. Gut microbiome x behavioral disorders: a literature review. Brazilian Journal of Health Review 2021, 4(6), 26586-26590 https://www.brazilianjournals.com/index.php/BJHR/article/view/26403

Publicação: Pebmed

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Vera Ângelo Andrade

Graduação em Medicina pela UFMG em 1989, Residência em Clínica Médica/Patologia Clínica pelo Hospital Sarah Kubistchek, Gastroenterologista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia, Especialista em Doenças Funcionais e Manometria pelo Hospital Israelita Albert Einstein, Mestre e Doutora em Patologia pela UFMG, Sócia proprietária da Clínica Nuvem Medicina BH.

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